Por: Enéias Tavares
Na quarta entrada do Noitário de Produção da websérie A Todo Vapor!, Enéias Tavares discute como é trabalhar com um baú ilimitado de histórias e personagens & como foi difícil escolher os heróis que vão protagonizar o primeiro audiovisual steampunk do Brasil!
O passado é um reservatório incrível de heróis, contos e aventuras, e ele está lá, esperando cada um de nós para buscarmos nele o que desejarmos ou precisarmos. No caso de A Todo Vapor – e de Brasiliana Steampunk como um todo –, trata-se de se ter à disposição apenas TODA a cultura, história e literatura do século XIX e início do XX. Como as leis de direito autoral e do domínio público no Brasil seguem critérios ainda dúbios, em sua grande medida baseadas em legislações norte-americanas e europeias, temos em nossas mãos o que bem desejarmos buscar, surrupiar, sequestrar e recriar, e tudo isso no melhor estilo antropofágico possível: devorando o que conseguirmos e devolvendo algo absolutamente novo e diferente.
A premissa de Brasiliana Steampunk, a saga retrofutrista brasileira que inclui livros – A Lição de Anatomia do Temível Dr. Louison e sua continuação/prequel O Parthenon Místico – e contos – Bento Alves e o Assalto ao Templo Positivista e Solfieri e o Espectro do Casarão Sombrio, entre outros –, é usar os heróis da nossa literatura clássica como narradores de novas histórias de mistério, aventura, horror e ficção científica, entre outros gêneros.
Os Heróis Literários do Parthenon Místico – Arte de Karl Felippe & Cores de Poliane Gicele
Quando começamos a trabalhar no roteiro de A Todo Vapor!, as opções eram ainda mais ilimitadas, pois se a dupla de protagonistas era inédita na série literária – Juca Pirama e Capitu de Machado – por que não trazer outras nobres aparições?
O elenco de Brasiliana Steampunk
Imediatamente pensei em três heróis que adoro e que eu ainda não tinha usado em Brasiliana: a Aurélia Camargo de José de Alencar, o Leonardo Pataca de Manuel Antônio de Almeida e o Seminarista Eugênio de Bernardo Guimarães. Mas e os heróis de Lição de Anatomia do Temível Dr. Louison, que muitos já conhecem da caçada ao Estripador da Perdição?
Dos acima mencionados que integram O Parthenon Místico – nas palavras de Juca Pirama, “os esquisitos amigos sulistas de Capitu” – apenas Solfieri ficou de fora. E isso se deu por dois motivos. De todos os personagens, Solfieri é aquele que é o mais desafiador: como um Dorian Gray, precisamos de um adolescente que tenha alma e olhar de idoso. Além disso, Solfieri traria consigo não só um ar de horror ao seriado que já estava contando com essa atmosfera como sua relação afetiva com Vitória Acauã, o que poderia travar a narrativa como um todo. Como Solfieri é um dos meus personagens mais amados, quero mais tempo para pensar como representá-lo adequadamente no audiovisual. Quanto aos demais, Luiz Carlos Bahia, Pedro Passari, Claudio Marsiglia e Pamela Otero foram os escolhidos para dar vida a Doutor Benignus, Sergio Pompeu, Bento Alves e Vitória Acauã.
Bastidores das Filmagens de A Todo Vapor! – Foto de Fabio Ghrun
Claudio Marsiglia, por exemplo, trouxe ao Bento Alves o aspecto aventureiro e determinado, formando com o Sergio de Pedro Passari uma dupla de investigadores do oculto impressionante e ousada. Se no Ateneu eles já eram “namoradinhos”, agora eles formam um casal de heróis que viaja pelo Brasil num portentoso balão – sim, há um balão no roteiro!!! – auxiliando os marginalizados da nossa nação brasileira e recuperando artefatos antigos e mágicos, como o facão amaldiçoado que decepou a cabeça de Antônio Conselheiro.
Expressão e representatividade A Todo Vapor!
Ademais, não deixaria de fora a oportunidade de discutirmos representatividade e homoafetividade em nossa série, temas que ainda carecem de maior relevo em obras pop e geek. Já Bahia deu a Benignus um ar de leveza e eletricidade que, por mais que já estivesse previsto no roteiro, surpreende aos mais acostumados com à figura séria e sorumbática de um velho cientista ou de um Mestre Kenobi da equipe. Já Pamela Otero trouxe para Vitória Acauã sua característica simpatia e força. Pamela tem uma voz grave e uma postura muito firme e ao mesmo tempo ágil. Estou louco pra vê-la controlando os ventos, invocando espíritos e ignorando as investidas nada discretas de Juca Pirama.
A Vitória Acauã de Pamela Otero – Foto de Fabio Ghrun
Estes são apenas alguns dos nossos heróis, que ainda contarão com duas participações mais que especiais: a do Temível Dr. Louison vivido por Ronan Horta e da inspiradora Beatriz de Almeida & Souza interpretada por ninguém menos que Aretha Oliveira. Em tempos de histórias – tanto literárias, quanto audiovisuais – que muitas vezes não apresentam personagens cativantes, é ótimo abrir o baú do passado e descobrir esses tesouros ficcionais. E ainda mais quando revividos por atores tão interessantes e talentosos. Estou louco pra ver essa bela Liga Extraordinária Brasileira nas telas!
Para concluir, uma história engraçada
Em eventos, volta e meia leitores me perguntam se eu ficaria ofendido se fizessem fanfics – ficção de fãs que usam personagens e mundos criados por outros autores – do universo de Brasiliana Steampunk. Minha resposta é sempre um sorridente: “Nem um pouco, afinal… Brasiliana Steampunk é a minha Fanfic dos nossos clássicos!” Aos escritores – experientes ou não – que estejam acompanhando nossa coluna, fica o convite para fazerem o mesmo com os clássicos dos seus estados e cidades. Na semana que vem, vamos falar dos vilões… Quer dizer… Dos principais suspeitos dos mórbidos crimes do Tarot!
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